sábado, 6 de dezembro de 2008

da série "detalhes" - A ROTINA DO CANSAÇO


- Problemas estomacais
- Analgésicos
- Válvulas de escape que só aumentam mais ainda as tensões
- Viroses
- Fim de semana que dura apenas 48 horas
- Cheiro de cigarro
- Desaprender o significado da expressão “refeição decente”
- Olheiras
- Antiácido
- Aprender a detestar: domingos à noite, finais de segundas-feiras, terças à tarde e quintas à noite.
- Chuva no asfalto
- Céu sem nuvem
- Goteiras em lugares impossíveis de achar
- Chuveiro queimado
- Televisão no quarto
- Boas-noites distribuídos penosamente
- Pijamas escuros
- Solidão de quarto
- Relógio atrasado

Para quando o cansaço for rotineiro.

da série "detalhes" - O CANSAÇO DA ROTINA


-Piadas de e-mail
-Happy-hours em preto e branco
-Confraternizações com alguma baixaria
-Bons-dias distribuídos mecanicamente
-Fim de semana que dura imensos dois dias
-Conversa de fila
-Música de ônibus
-Café da firma
-Cheiro de álcool típico dos lugares desprovidos de calor humano
-Ar-condicionado
-Calor de asfalto
-William e Fátima
-Solidão de sala de estar
-Comida que enche e não satisfaz
-Cama de casal cheia de espaço
-Despertador

Para quando a rotina for cansativa

Olhem só que engraçado...

“... o esforço pra lembrar é a vontade de esquecer...”
(Rodrigo Amarante)

Conversando sobre mais amenidades da vida com a minha grande amiga, chegamos aos versos de Amarante em “O vento”. E, que genial, é uma frase que serve de esqueleto para muitas verdades. Experimentem:

- O esforço pra dormir é a vontade de acordar.
- O esforço pra jejuar é a vontade de comer.
- O esforço pra calar é a vontade de falar.
- O esforço pra rir é a vontade de chorar.
- O esforço pra mudar é a vontade de permanecer.
- O esforço pra ir é a vontade de ficar.
- O esforço pra perdoar é a vontade de culpar.
- O esforço pra ensinar é a vontade de aprender.
- O esforço pra odiar é a vontade de amar.

Uma questão: seria a vontade uma espécie de sina, afinal?

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Carta à Preguiça

Prezada colega,

Escrevo informalmente para dizer que seus serviços de tantos anos serão recompensados. Mas infelizmente, não será possível mantê-la durante muito tempo nesta empresa. Entenda: o horário de almoço diminuiu, estamos numa época de grande demanda de clientes e a área de atuação vai ter que diminuir... Quem sabe se você se encaixar em outros setores, como o de informática? Ou de produção artística? Ou de repente em um setor em que as ordens venham de cima e as decisões sejam tomadas por alguém mais influente? Quem sabe você se encaixa aos poucos... como quem não quer nada... apenas se entrosando com o pessoal... Quer um conselho? Não chegue dando ordens, invadindo os espaços ou ditando o ritmo de trabalho. As pessoas se sentem intimidadas com muita influência. E você sabe que tem um potencial, não é, garota?
Acontece que se você chegar botando banca e mandando em tudo, podem te confundir com a temida folga... Sabe como é: funcionário preguiçoso, atura-se até certo ponto... Mas um funcionário folgado... iiiih... É inaceitável.
É preciso que você deixe de lado os setores ligados à administração e à criação de qualquer coisa! Fontes seguras confirmam que sua influência não é muito bem vista nestes lugares...

Ok, ok... Acho que você já percebeu. Preciso ser mais direta, estou enrolando: não faça planos financeiros para 2009... A verdade é que a qualquer hora podem te dispensar...
Não crie laços nesta firma: trabalho é trabalho. A Criatividade, com aquele nariz empinado, e o Dinamismo (você sabe como ele é competitivo, o desgraçado!) estão só esperando você dar qualquer deslize! Fique atenta, eles são muito falsos. Lembra da aula de marketing que tu procrastinou? Pois bem, lá falava que o mercado ia te engolir!
Mas calma... não se desespere. Sempre haverá um espaço pra você. Aquela hora do almoço demorada... aquela conversa jogada fora na copa, no cafezinho... As pesquisas inúteis na internet...
O que me deixa aflita é saber que nem no clube do Nadismo você é bem-vinda... Ter preguiça é fazer algo, entende?
Nada contra, você sabe que eu sou tua simpatizante, moça... Mas ordens são ordens... Sabe como é.

É pra você passar no RH depois do expediente.

Sabe, você poderia tentar algo no funcionalismo público... Ou quem sabe tentasse estudar de novo...........................


(...continua indefinidamente... Pois dela, a gente não se livra nem com abaixo-assinado)

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Com açúcar, tempero, boas idéias e muuito... muuuuuuuuito afeto...

Qual foi a coisa mais bonita que já te disseram nessa vida? Não vale “eu te amo”.Quer dizer, até vale, desde que seja de uma forma criativa.
No final de semana passado, quando tudo ia tão mal, enxerguei de forma contrária tudo o que vinha me acontecendo até então.
Bom. Mais esclarecimentos para que vocês possam entender. Sobre o meu estágio: passei (e ainda passo) semanas infernais por conta do Natal. Aaah... O Natal! Essa época tão mágica, encantada e empolgante, capaz de fazer o clima equatorial e desértico de Macapá se tornar o mais agradável do mundo inteiro... Pois devo avisá-los: isso não acontece em uma agência de publicidade, queridos. O clima muda, mas a pressão é a mesma. Criar roteiros para propagandas relacionados à época de festividades tem virado um martírio pra mim. Martírio a ponto de querer dar um belo chute no saco do Papai Noel. E quebrar asinhas de anjo, esganar cantores de corais, etc... O simples tilintar de sinos já me faz ficar em estado de alerta.
Toda essa tensão, como eu já previa, resultou num dos meus maiores pesadelos. Conhecida de vocês, leitores, que acabam tendo que engolir qualquer coisa que eu escreva: a tal da falta de criatividade!
Pensem: como ser criativo ao tentar vender um mesmo aparelho celular em três operadoras diferentes? E quando essas mesmas três operadoras são cooperadas de três lojas diferentes? Imagino que tenham feito as contas. Dá um total de nove roteiros. Certo. Só que para cada roteiro, é necessário mais duas opções. Drama. Cérebro murcho. Estafa mental. Desculpas esfarrapadas, bem sei.
Juro por tudo que se ache de mais sagrado que cheguei a pensar em formas bem descaradas de expor um telefone em pleno Natal. Ok, acho que entreguei algumas dessas idéias no meio do trabalho, tamanho o desespero.
No fim de tudo, concluo que não tem sido muito tranqüilo e que é inevitável não falar ou sonhar ou escrever sobre trabalho. O ápice de todo esse rebuliço foi uma chamada da chefe: “Superficiais demais. Acredite sim no produto. Mas lembra que é Natal, vai com calma. Sem contar que achei tudo meio igual...”
Eu poderia revidar tentando explicar a essência superficial do texto publicitário. Mas eu não estava apta para falar disso, fiquei desarmada. A tal da banalização da data de aniversário de J.C. já foi e é tema de muitos outros blogs por aí. De certa forma, admiro quem tenha a pachorra de acompanhar e discutir a respeito. Fato: não fui muito criativa no trabalho que desenvolvi, isso me afetou profundamente e vim chorar as pitangas aqui.
A criatividade, amigos, está relacionada com a capacidade de resolver problemas. O criativo encontra soluções práticas e alternativas para os pepinos do mundo. Alguém dizer que você não foi criativo em alguma coisa é deprimente. É o mesmo que dizer “você não foi capaz de resolver ISSO?! Fiascoooo...”. E , para mim, é o fim.
Maaaaaaaaas, tive a minha volta. A frase que eu precisava. A boniteza que me fez esquecer o fiasco e me inspirou (acredito) a persistir no exercício da diferença e do destaque.
Adoro cozinhar. Acredito que é a forma mais primitiva de levar felicidade a alguém. Parece que ver pessoas satisfeitas com a comida deve ser a mesma sensação que se tem ao matar um monstro muito malvado. Matar a fome e ainda deixar alguém satisfeito por ter saboreado um prato bem feito e gostoso é lindo. É mágico. É meu hobby, aqui confessado. E nesse fim de semana, depois de uma fornada de cookies de granola, a nossa sala de casa ficou cheirando (que ironia...) a Natal. Vocês sabem: cheiro de canela, chocolate e qualquer outra especiaria têm cheiro de Natal.
Minha mãe, que não é acostumada a gabar as nossas qualidades (não condeno e até acho estimulante), pegou um dos cookies e foi para o seu quarto compor. Fiquei na sala, vendo TV e a tigela de biscoitos ficando vazia diante da gula dos meus irmãozinhos. Computador, quarto, cozinha, copo d’água. Sentei de novo no sofá, quando vi a figura pequenina e agitada de mamãe abrir a porta do quarto. Com a cabecinha de fora e um sorriso que só lembro ter visto num porta-retratos antigo da minha avó, ela disse:
- Filha, esse cookie é uma das coisas que eu mais gosto de comer na minha vida.
E fechou a porta antes que eu pudesse esboçar qualquer reação.
A minha reação é este texto e a constatação de que sempre se pode fazer alguém um pouco menos triste. Seja na cozinha, no Natal ou na publicidade.
Entreguei os roteiros refeitos. Faltam serem aceitos.
Ou não.
Qualquer coisa, uma fornada de cookie deve resolver.


P.S: Tive saudades disso aqui em momentos mil...

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

A série de uma não-detalhista

Acho que vou mudar o nome do blog de “quarto” para “confessionário”! Tem sempre algo pessoal envolvendo isso aqui. Nem queria que fosse, mas...

Pois bem, dessa vez, escrevo sobre detalhes. Não!! Não é mais uma das listas às quais vocês estão acostumados... Listas, inclusive, que me renderam elogios, mesmo de pessoas que não deixam seu comentário e endereço pra contato; porém, sei que são bons leitores e freqüentadores desse cantinho aqui...Obrigada! Sempre pensei que um dia a série “detalhes” fosse ter fim por simples falta do que escrever. Mas a cada comentário e sugestão, percebo que ainda há muito a “detalhar” em listas...

Mas a princípio, queria esclarecer que “detalhes” é uma série que não tem a ver comigo, se vocês tomarem ao pé da letra. Não parece, mas eu sou a pessoa mais generalizadora que vocês podem conhecer. Nunca fui atenta a detalhes; eles me passam de forma despercebida, pois sou muito distraída... Esse é um dos motivos pelos quais eu faço listas: para lembrar o que pode me fugir à razão.

As pequenas coisas da vida, os pequenos prazeres nunca foram detalhes para mim, na verdade! Fazem parte do meu dia-dia, assim como ir para a faculdade. Acredito que tudo o que listo na série é muito habitual para mim. Assim como para Arnaldo Antunes, acho que “as coisas têm, peso, volume, tamanho, tempo, forma, cor, densidade, cheiro valor...”. Isso não é detalhe nenhum, queridos. É comum. Se sentirmos que o cheiro de alguma coisa é um detalhe, não é diferencial. É insensibilidade. O cheiro está lá para ser sentido...

Agora: por que o nome da série é “detalhes”? Por um acaso teria o mesmo efeito sobre vocês se tivesse o nome de “série coisas comuns que eu acho que deveriam ser comuns para todos”? Foi impossível escapar desse termo... É acessível, direto e todo mundo entende...

Bem, no fim, tudo isso é para esclarecer de vez que eu não sou uma detalhista. Detesto esse tipo de rótulo. Detalhistas são metódicos, chatos, organizados, racionais e chatos outra vez. Então, deixo uma pergunta pra vocês pensarem a respeito: o que é o detalhe perto da sensibilidade das minúcias?

Um detalhe pode ir muito além do hábito. Mas nunca vai alcançar a plenitude de quem é sensível. Um detalhe, para mim, continua sendo um detalhe.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

da série "detalhes" - A EXPRESSÃO DA FELICIDADE


- Fazer as pazes e ir dormir tranqüilo
- Sorrir para o espelho de manhã
- O olhar cúmplice de depois do amor
- Dançar sem nenhuma vergonha a música favorita (dentro do seu quarto, claro...)
- Engolir o vento que sopra na frente da cidade
- Bolhas de sabão
- A liberdade do pára-quedista
- O aroma de vida que têm os bebês
- O gosto de fermento fresco que tem o pão que a minha avó faz
- Os intermináveis mantras de “My sweet lord”
- As ruguinhas dos cantos dos olhos azuis de Chico Buarque
- As cores das jujubas
- A obra inteira dos Beatles*
- Afinidade logo de cara
- Canções da infância
- Definitivamente, o “Yellow Submarine”
- Início do show da sua vida

Expressões de felicidade podem ser mais longas que a própria felicidade.

* Citar Beatles em uma lista é tão cretino... Parece um tanto simplório, mas espero que entendam que esta foi uma tentativa de incluí-los e registrá-los em tudo o que faço cada vez mais...

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

da série "detalhes"- A FELICIDADE EXPRESSA


- Ganhar uma discussão
- Uma dose a mais
- Barriga cheia
- Acordar com o despertador, perceber que é feriado e voltar a dormir
- Cheiro de Vick Vaporub
- Gosto de uva artificial
- O musical final de “Grease”
- O último dia da menstruação
- Os vocais do Beach Boys em “God only knows”
- Achar várias jujubas vermelhas num pacote só
- Barulho de fritura
- Banho frio ao meio-dia em Macapá.
- Cheiro de açaí novo
- Achar algo que havia se perdido quando se está procurando outro algo
- O sorriso inconsciente do recém-nascido
- Paixão de verdade
- Fim de um filme bom
- Orgasmo

Felicidades expressas são mais curtas que a felicidade.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Ter sorte e ser forte

SER MAIS QUE ALGUÉM, É SORTE.


SABER MAIS QUE ALGUÉM, É FORTE.


SABER MAIS, É SER MAIS QUE SI MESMO.

(por Naiara Martel, que não é forte nem tem sorte)

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Nº 3

Saulo adorava sentar naquela cadeira à esquerda, dentro do ônibus, atrás do motorista. Era mais alto de lá, mais perto da porta, da janela, e, no mais, era Seu Lugar. De Seu Lugar saíam poesias, idéias, monólogos e até palestras.
Pegava o ônibus sempre no primeiro ponto, depois que saía da garagem. Sentava em Seu Lugar e ali permanecia, curtindo aquela meia hora de meditação.
Um dia, ao subir no ônibus, deparou com uma surpresa enrugada: um velhinho sentado em Seu Lugar. Cabelos brancos, devidamente agasalhados no chapéu xadrez, roupinha de missa e um pacote de remédios. “Típico...”, devaneou Saulo. Inofensivo? Não para Saulo. A cada ponto que passava, seus pensamentos se desordenavam. Em pé, bem ao lado de Seu Lugar, ondas de raiva começavam a passear pelo seu corpo. Iam à sola do pé e arrepiavam sua espinha. Num ciclo cada vez mais rápido, as ondas só o faziam pensar que ele precisava arrumar um lugar para o ancião audaz. E rápido! Entre uma onda e outra, pensou em simular um desmaio, puxando o casaco do seu adversário e suplicando misericórdia. O plano foi abaixo quando o velhinho tossiu feio e de verdade, despertando a comoção da maioria dos passageiros no ônibus. “Sem Meu Lugar, espremido por esse monte de gente acudindo o velho e ainda em pé!”, praguejava sincero e aflito.
Até que o veículo pára. Estanca na frente de outro ponto de ônibus. “É. Deu prego.”, sentenciou o motorista. Saulo sai do ônibus com cuidado, sempre olhando para trás, deixando a confusão com o velho doente e sua tosse ameaçadora.
Logo avistou outro ônibus. Fez sinal. Entrou pela frente e, com o coração palpitando, viu Seu Lugar vazio. Estava intacto.
Aquela meia hora passou leve, lenta e deliciosamente prazerosa. Era impossível esconder o sorriso dali de cima.
Saulo transbordava felicidade.

Nº 2

Jade, 5 anos, no banco de trás do carro, estava eufórica. Brincou a tarde inteira, compraram sua boneca favorita e ainda comeu na lanchonete que vende brinquedos e dá sanduíches de brinde.
Tarde mais perfeita que esta nunca existiu nem existirá na sua vida.
Jade, 10 anos, no banco de trás do carro do seu pai, estava encantada. Apresentou-se a tarde inteira no festival de dança e ganhou uma estrela de “Pequena grande dançarina”. E ainda comeu na lanchonete que vende brinquedos e dá sanduíches de brinde. Mas desta vez, preferiu sem picles.
Tarde mais perfeita que esta nunca existiu nem existirá na sua vida.
Jade, 15 anos, ao lado da sua mãe no carro, estava apaixonada. Beijou a tarde inteira, passeou de mãos dadas, tomou Milk-shake dividindo o copo... E ainda comeu na lanchonete que vende brinquedos e dá sanduíches de brinde. Guardou o brinquedo para seu irmão mais novo.
Tarde mais perfeita que esta nunca existiu nem existirá na sua vida.
Jade, 25 anos, dirigindo seu carro, estava bêbada. Bebeu a tarde inteira, falou bobagem, pagou mico no chá de panela e acha que beijou o stripper da sua despedida de solteira. Acabou de ser promovida no trabalho. Mas não lanchou na lanchonete que vende brinquedos e dá sanduíches de brinde porque estava de dieta.
Tarde como esta...
E Jade, 75 anos, na cadeira de balanço, estava velha. Bordou a tarde inteira, dormiu e sonhou com o paraíso. A lanchonete que vende brinquedos e dá sanduíches de brinde já havia falido. Mas ela se lembra do grande “M” amarelo num fundo vermelho. Lembrou também das tardes mais perfeitas que já existiram e nunca mais existirão na sua vida.
Aí, enfim, foi a tarde perfeita.

Nº 1

Dentro da saladeira, aqueles camarões graúdos e rosados que imploravam maionese, roubavam o aroma das ervas frescas. Eram um espetáculo à parte: croutons dourados que dançavam em manteiga derretida, fazendo um barulhinho estalado que sugeria a textura.
Sílvia acompanhava tudo, vigiando o macarrão com desconfiança de esposa. Um minuto a mais e o ponto ia-se embora. Macarrão é um prato carente. Exige atenção redobrada para satisfazer o nosso paladar. Um descuido ou atenção demasiada para o molho e, traição! Escorrega mesmo.
Depois do jantar pronto, ela arrumou a mesa como no restaurante. Velas, flores e a melhor prataria. Vestiu seu melhor vestido e serviu o próprio prato. Então comeu. Mas saboreou os detalhes. Sentiu os aromas com menos pressa que o normal. Permitiu-se sujar o vestido com molho e desbotar o batom dos lábios. Usou guardanapos de seda. Sabia que não iria utilizá-los depois.
Sílvia levantou-se devagar da mesa. Com os olhos marejados, apoiou-se no balcão para despedir-se daquele santuário, o seu local de trabalho. Era óbvio. A cozinha sentiria também a falta das mãos delicadas arrumando o balcão para os homéricos espetáculos gastronômicos ali realizados. Também as sopeiras sentiriam falta do suor adocicado que provocavam nas têmporas de Sílvia. As facas já preferiam ficar cegas a não acharem mais os dedos finos e distraídos. E o fogão... O mais sentido de todos. O que penetrava sempre a intimidade, aquecendo-lhe a barriga... O avental perdeu a forma acinturada, pendurado flácido na área de serviço...
Foi uma penosa despedida. E num lance de vertigem, a cozinheira condenada pelo câncer sentiu o peito apertar, a jugular dilatar e o ar lhe faltar. Como sempre, em tudo na sua vida, o coração falou mais alto. Mais alto que o tumor. E mais alto que a tristeza, pois seu último pensamento dizia: “O macarrão estava perfeito. A salada de camarão foi a melhor que comi em toda minha vida.”
Sílvia era alérgica a camarão. E sabia disso.

Fragmentos de felicidade expressa

Felicidade expressa é aquela felicidade de segundos, minutos, no máximo um dia. É aquela boa sensação de vitória quando ganhamos uma discussão besta. Aquele sorrisinho de lado que esboçamos aos excluídos quando passamos para uma área VIP. Ou o alívio que antecede a culpa por comermos um doce a mais ou fumarmos um cigarro a mais. Era pra ser um estado contemplativo. Era pra ser curtido sem culpa nenhuma. Mas é tão curto, dura tão pouco, que nem estado é considerado.
Imagino se um dia, por estarmos cansados da busca pela felicidade, começássemos a juntar todas essas passagens da alma humana que nos acometem em um fragmento único. A busca sofrida pela felicidade acabaria, com toda a certeza. Livros de auto-ajuda juntariam poeira nas prateleiras. Consultórios terapêuticos ficariam mais vazios que a própria proposta da terapia. E seria felicidade para jogar fora por aí. Daria até dor de barriga.
Logo, logo, a idéia inicial de felicidade expressa estaria acabada. Mais uma das minhas teorias furadas.
E em mim se instalaria um profundo vazio criativo.
Seguem, em três partes, fragmentos de felicidade expressa. Ou talvez expressões de felicidade apenas. Entendam da forma que acharem melhor.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

domingo, 28 de setembro de 2008

da série "detalhes" - A DOUÇURA DO IRRITANTE



- Acordar com canto de pássaros
- Sussurro da pessoa amada perguntando se você está dormindo quando, na verdade, está pegando no sono
- Vozes de : mãe irritada, John Lennon, Marcelo Camelo, Bob Dylan e Vanessa da Mata
- Receber um tapinha nas costas depois de um abraço
- O queijo derretido da pizza
- Soluço de neném
- Cócegas
- Estourar plástico-bolha
- Não conseguir jogar fora papéis acumulados pelo tempo (de extratos bancários a bilhetes fofinhos)
- Barulho de chuva na calha
- Gato miando
- Aquele barulho de gelo triturando na boca
- Talheres batendo em almoço de domingo
- Estômago roncando
- Sua avó mostrando fotos antigas suas para visita
- Minha avó repetindo as mesmas histórias
- Dormir de luz acesa
- Justificar qualquer falha com flores nas mãos
- Encontrar um amigo que só fala de amor e solidão em tardes de domingo

Certas coisas irritantes têm um fundo de doçura.

da série "detalhes" - O IRRITANTE DA DOÇURA


- Enjôo
- Balas que grudam nos dentes
- Abraço forçado pelas convenções, de meio corpo
- Ouvinte compreensivo demais
- Sandy
- Casamentos
- Cachorro carente
- Algodão-doce
- Cafunés
- Aqueles dois beijinhos que te dão ao te cumprimentar
- Sentimento de pena
- O olhar de Paul McCartney
- Vestidos floridos
- Crianças artistas
- Cheiro de baunilha
- Voz macia em palavras rudes
- Choro baixo
- Sorrisos demais (verdades de menos)
- Aeromoças

Certas doçuras são no fundo irritantes.

sábado, 6 de setembro de 2008

A pureza dentro das palavras

Não é que eu tenha voltado. Muito menos que a vida ande menos agitada que o costume novo. Continuo trabalhando, estudando e sem o menor tempo pra pensar no quarto verde. Nem no próprio quarto verde, o que dá nome a esse espaço, eu tenho dormido. Mas posto aqui pela velha e insana necessidade de escrever, amados...
Tudo o que tem acontecido nestes últimos dias contribuem para este post. Desde experiências alheias até as minhas próprias, também alheias.
Não lembro se cheguei a comentar aqui que faço faculdade de Letras. Se não, está aqui informado. Guardem esta informação. Ela é fundamental para que vocês entendam a minha relação com as palavras.
Fato maior é que ando meio preocupada com as pessoas no mundo. As do meu mundo, claro... Não sei, mas parece que elas não andam mais atentando para o que falam, o que prometem, o que precisam cumprir, honrar...
É muito difícil para mim, um alguém que ama lidar com palavras na vida e na carreira, ouvi-las e não relacioná-las ao significado na minha vida e ao que elas vão me proporcionar como conseqüência.
Certo, as palavras são importantes. Mas para mim, chegam a ser sagradas. EU tenho um pouco de obsessão com comunicação e expressividade. Por isso, tomo o maior cuidado quando vou usá-las.
Palavras são muito inofensivas em sua natureza. Permitem que você abuse delas; que brinque, destrua, desmembre e distorça-as.
É aí que mora o perigo. O que elas são capazes de fazer quando você se apropria delas. Ganham um poder espetacular, pois se juntam à retórica e ao estilo. Ao seu tom de voz. À sua letra. Ao seu conhecimento ou não sobre elas. Aí, elas pertencem a você. Esta é a relação mais apaixonada que existe: a das palavras com nós mesmos. Elas possuem uma ligação com a gente que pode nos enlouquecer...
Daí, as conseqüências são infinitas. Você pode se tornar tudo. Um gigolô das palavras, por exemplo, como o próprio Luis Fernando Veríssimo se define. Apenas as usa de acordo com sua vontade e se aproveita impiedosamente delas. Neste caso, você é um escritor muito do safado...
Outra alternativa é se tornar um bobo que tem medo delas. Não consegue escrevê-las, pronunciá-las, sussurrá-las ou lê-las. Muito menos cumpri-las, honrá-las, reformulá-las, desdizê-las ou mesmo estreitar as relações com elas... É com esse tipo de medroso que tenho me deparado ultimamente.
Quero crer, de todo o meu coração oco e sangrento, que sejam medrosos passageiros (não na minha vida, mas de um medo passageiro em si). Que sejam curados. E que nada deste medo tenha a ver com o caráter, mas, sim, com pura inabilidade mesmo.
Estes tipos de medrosos causam as maiores decepções na alma de pessoas como eu: os escravos das palavras. Aqueles que necessitam ouvi-las, senti-las, percebê-las nos olhos de quem nos fala; que necessitam vê-las se cumprindo.
As palavras são puras. Nós somos os corruptores.
Texto triste e chateado.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008



Comunicado


Em: 16 de agosto de 2008
A: Todos que me visitam

Assunto: Recesso de Agosto/Setembro

É isso aí. Estou em reforma. Antes que perguntem se vou voltar, adianto que sim (apesar de nunca ter visto uma reforma acabar...). Mas esta reforma tem um tempo indeterminado. Os motivos são muitos. O maior deles é a minha incapacidade de administrar o meu tempo. “Ah, mas todo mundo tem um probleminha com disciplina...”. Não. Eu não tenho. Eu não sei o que é isso, como vou definir como problema? Por isso, quando digo que não sei dividir meu tempo, é porque eu não sei, não sou inteligente pra isso não. Pois bem... Eis que depois de meses e meses engordando, dormindo e canalizando minha capacidade criativa nos textos aqui postados, resolveram aproveitar esta minha suposta qualidade (a de criar alguma coisa...Estaria no paraíso se fossem as capacidades de comer ou de dormir que estivessem sendo aproveitadas) para que eu pudesse ganhar por aí uns trocados. Enfim, um estágio na área de criação de uma agência de comunicação. Meu cérebro anda em curto, fico com sono danado nas aulas de Literatura Inglesa e Estilística, meu estômago tem reclamado um pouco e minha resistência também... Ok, ok... Sei que tem um ar de “explicação” (sabem que eu detesto explicar)... Mas prefiro dar satisfações a sumir e deixar meus poucos (são poucos porque são especiais) e melhores leitores (que são todos, sem nenhuma exceção). Contribuem também para o recesso o meu banco de idéias, que tem me deixado na mão (e me rendido uma vergonha que não conseguiria demonstrar em palavras, pois me faltam elas...). Desculpem por tudo: pela falta de criatividade, pelo abandono, pelo texto bobo, e por tudo o que eu postei ou venha postar que seja chato, pedante ou simplesmente ruim (nossa... parece que eu nunca mais vou voltar, hã?)
E para falta de criatividade, só um texto com cara de comunicado de empresa feito com a ajuda do assistente de carta do Word.






Obrigada gente!






A blogueira
(do quarto verde, porta à esquerda)

sábado, 9 de agosto de 2008

O crescimento do aprendizado


- Entender que o erro sempre é uma falha. O resto é romantismo.
- Serenidade vem em qualquer idade.
- Menos nem sempre é mais. Porém, o mais SEMPRE será mais.
- Julgamento de valores é válido quando se tem filhos, sim.
- Convivência com animais (em todos os sentidos).
- Saber que nem sempre ser distraído é sinônimo de estar além.
- Discos de vinil.
- Remédios caseiros.
- Cheiro de chuva.
- Conversar com crianças.
- Deixar os mais velhos falarem.
- Evitar conversas adultas demais.
- Conhecer pelo menos uma pessoa por inteiro.
- Mudar de opinião.
- Economizar, mas nunca deixar de usar a frieza.
- Aprender que nem tudo está nos livros.
- Perceber que ler é uma experiência pessoal. Compartilha-se apenas se quiser.
- Já escrever, não.

O aprendizado sempre pode crescer.

O aprendizado do crescimento


- Ficar longe de tomadas.
- Se dar conta de que os palhaços não têm a menor graça.
- Apreciar os benefícios da mentira.
- Descobrir que seus pais já experimentaram: maconha, porres homéricos, beijo gay.
- Pior: descobrir que eles não são mais virgens.
- Correr e perceber que o corpo não tem mais 10 anos de idade.
- Comer e perceber que o corpo não tem mais 10 anos de idade.
- Aborrecer-se com chuva ao invés de ter medo ou vontade de tomar banho nela.
- Dormir no escuro.
- Ver o banho como necessidade.
- Ter nojo de lama.
- Conhecer a nostalgia.
- Ser louco pra namorar e descobrir que também pode ser uma roubada.
- Contatos imediatos na faculdade.
- Ser apresentado ao conceito de “tudo é relativo”.
- Amizades verdadeiras.
- Aperfeiçoamento infinito de ser humano sem nunca chegar à perfeição.
- Decepcionar-se.
- Decepcionar.

Crescer pode ser puro aprendizado.

Aos pedaços, aos pouquinhos.

Via tudo muito lento. As letras dançavam no papel. Estava bem frio. Eu, em passos rápidos, inclinava o corpo pra frente, enrugando a testa bem próxima à carta, como que para prestar mais atenção ao seu conteúdo. Tentando ler em movimento, no escuro. Até me encontrava nas frases, só faltava o sentido delas. Ler mais uma vez no meio da confusão nem adiantava mais.
O corredor de gente não ajudava. Era mais fácil passar esbarrando do que tentar ajudar aquela que se equilibrava no salto apertado com um copo de café numa mão e uma caixa e um pedaço de papel na outra. Resolvi sentar num banco e tomar o café já morno. Naquele exato momento, pude saber a sensação da tal “solidão em meio a tanta gente” que dizem por aí. Finalmente o clichê se cumpria ridículo e literal.
O dia não tinha sido fácil pra mim. Trabalho acumulado, chefe sádico e horas extras. Assim, tive que sair muito tarde e peguei aquele tumulto na saída do prédio comercial. Almocei com a minha mãe e ouvi que estava ficando louca de deixar Juliano vir morar comigo. Juliano... meu novo quase-amor... “Isso não é sério!”, ela disse. Ela me conhece, as mães são assim. Mas ela não sabe muito. Ela não me conhecia como ELE me conhecia. Nem eu, pra falar a verdade.
Estávamos juntos há 8 meses, 3 semanas, 2 dias e 14 horas até a hora daquele café.
Ao chegar do almoço, na agência, Lila me avisou que Juliano tinha passado por lá. “Deixou aquilo ali...”. Havia uma caixa, uma margarida murcha [?] e um envelope em cima da mesa da copa.
Aquilo se tornou um hábito. Desde que nos conhecemos, Juliano ia na agência toda a semana e deixava uma lembrança. “Um pouquinho de mim, pra você sempre me ter por perto.” Assim ele dizia. Bonitinho. Às vezes, eu só lembrava de abrir a caixinha e ler as cartas depois do expediente. Eis um erro possível por meus múltipos defeitos. Um erro que não considero lá tão errado, pois pra mim, a indiferença deve ser justa com todos. Juliano não seria exclusivo... Pois bem, nesse dia, não abri a caixa e muito menos li a carta antes de sair do prédio, às sete da noite.
Ele era intenso. Em todos os sentidos. Chorava alto, tão alto que, às vezes, incomodava. Quebrou uma xícara que eu tinha, uma xícara de um design exclusivo, num acesso de raiva (o único que eu presenciei). Conseguia como ninguém atingir os meus pontos fracos. Sabia o timbre exato do ruído que me irritava ao esfregar os pés no chão molhado. Atacava minhas cócegas no ponto exato: entre as costelas e a bacia, apenas do lado direito. Conhecia todos os detalhes do meu corpo, cada pinta, cada marca; todas as formas de toque que pudessem fazer arrepiar os pelinhos da minha nuca. Desde os primeiros dias, ele já me sabia toda. Sabia diferenciar todos os meus sorrisos. Todas as minhas expressões indiferentes, sarcásticas e raivosas, ele sabia. Assim era Juliano.
Eu não o conhecia tanto. Ou não queria. Ter a sensação de penetrar e fazer parte dos sentidos alheios me angustiava. Todo encontro era perturbador. Me sentia cada vez mais dentro da vida de Juliano. Resolvi então que não fugiria mais uma vez. Era o quase-amor mais longo de todos que já tive. Devíamos morar juntos. Propus, ele aceitou e espalhou as coisas dele dentro do meu mundo.
Infelizmente, a sensação de me misturar a Juliano incomodava sempre. Não era eu. Então, decidi que não o conheceria mais. Juliano seria mais de um pra mim, de forma que nunca conseguisse conhecê-lo de verdade. Todas as vezes que nos encontrávamos, tentava enxergar outro olhar, ouvir outro tom de voz, outra conversa e sentir outro cheiro, outra sensação na pele. No fundo, sabia que não adiantava, ele sempre estava lá. No rosto, estampava um sorriso (lindo), em paradoxo com o olhar melancólico. Esta imagem era sempre a mesma em todos os Julianos que conheci.
E todas essas sensações foram interrompidas. No café morno como o meu sentimento, sorvi alguns goles amargos até pegar a caixa e ver o que havia dentro. Aos poucos, fui me vendo em pedacinhos guardados: um lenço com meu batom, um lacinho de alguma das minhas calcinhas, um grampo do meu cabelo, o desodorante que deixei junto com a echarpe na casa dele, um post-it verde-limão com as palavras apressadas: “hj saio + cedo. passo aí s der. bj”, um pacote de jujubas pela metade fechado com fita adesiva, meu cd do Cartola (sabia que não havia perdido!) e o único presente que lembro dar e ver ele esboçar o sorriso mais bonito do que todos os que ele tem; um bilhetinho com algumas palavras que escrevi quando esqueci que era nosso aniversário de namoro. Escrevi no barzinho mesmo, num lencinho, depois de umas taças de vinho:
“Feliz esse dia. E todos aqueles em que te encontro e não soltamos mais as mãos. Nem pra dormir. Que venham mais desses pra alegrar minha vidinha assim, sem-sal.”
Sentindo os olhares da multidão me aquecerem no frio que fazia naquele momento, enxuguei as três parcas lágrimas que consegui derramar. Peguei a margarida nas mãos e sorri divertida. Era a margarida mais feia que tinha visto em toda a minha vida. E olhei mais uma vez a carta. Dessa vez, consegui entender. Com a letra bem menos caprichada que das outras que já tinha lido, mas nada comparado ao conteúdo, conheci (ou reconheci?) mais um Juliano naquelas linhas:
“Esta margarida, eu colhi do meu canteiro. Aquele que você achava feio por causa da samambaia. Nesta caixa, está tudo o que seu que você ‘deixou’ ou se permitiu esquecer pelas minhas memórias. Infelizmente, não posso resgatar o que eu deixei com você, pois você me arrancou de mim mesmo. E será bem difícil eu me trazer inteiro de volta.
Parto para o Rio às 4 da tarde. Se quiser mesmo, de verdade, morar comigo pra se entregar de vez (não aos pedaços, aos pouquinhos), eu espero por você no aeroporto. Do contrário, já tirei minhas malas do apê. A chave está com o Mathias.”
Pula uma linha, data, rubrica, algum “p.s.” rabiscado. Acreditei por um momento que fosse um “eu te amo.”
Deixei o vento levar o pedaço de papel, tomei o resto do copo de café e fui atrás. Atrás do Mathias, que ficou com a chave do meu apartamento, claro... Estranhamente, senti que um peso das costas se ia...
Não tenho ainda certeza de que foi um erro ler a carta tarde demais (para Juliano). Só tenho certeza do erro que sou eu.
Boa viagem, quase-amor.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Pelos cotovelos

Eu não gosto de falar. Confesso ser melhor ouvinte que locutora. Tá, os que me conhecem sabem que também não sou uma anti-social, tampouco tímida ou caladona. Mas sabem (se não, sabem agora) que detesto perder tempo em discussões inúteis ou explicações extensas. A última é por questões mais profundas... Um dia escreverei sobre minha aversão a explicações demais. Mas deixo já claro que elas me fazem sentir estúpida.
Devo me defender dizendo que adoro conversar e ouvir o que os outros têm pra dizer. Meu problema é o falar por falar. O desperdício de saliva e palavras. Antes o silêncio do que agüentar um falastrão. É a boa e velha história: não tem nada pra dizer? Pois bem, fique calado... É uma atitude elegante e admirável.
Primeiro: quando se fala muito, pouco se ouve. Vale inclusive para o ouvinte. Eu, por exemplo, já perdi a conta de quantas vezes deixei de prestar atenção em diálogos-monólogos, onde o linguarudo só espera a vez pra falar. Prestar atenção no feedback do ouvinte? Nem pensar... o tagarela, quando se dispõe a tagarelar (geralmente sobre si mesmo e sem a menor intimidade com os integrantes da rodinha), tagarela mesmo! Tem sempre opinião sobre tudo (e todos...) e a maioria delas não acrescentam coisas novas às discussões.
Não sei. Deve ser pura teimosia e birra minhas, mas quando estou em uma roda em que só um fala, não presto mais atenção na conversa. É meio controverso para quem diz ser uma ouvinte razoável, sei bem disso. Acontece que as palavras que escuto parecem tomar uma nova forma quando proferidas por um falante tagarela! Tipo: “blabláblá...”, ou um disco furado... Ou um disco de “blábláblá” furado! Vai ver foi um mecanismo de defesa que desenvolvi contra os empolgados com discursos...
E, por tudo isso, o verbo “falar” tem ganhado cada vez mais sinônimos negativos no meu vocabulário... As situações em que o verbo tem sido posto em prática ultimamente não têm sido agradáveis... Geralmente têm ganhado significados como “ato ou efeito de imitar papagaio” ou simplesmente “encher lingüiça”.
Ok, fiquem calmos, de repente é uma fase. O mundo precisa da fala, isso é óbvio. Sim, eu acredito na força do diálogo, nas conversas agradáveis, onde se aprende um com o outro. ISSO é comunicação saudável. Agora... sair falando pelos cotovelos que nem um desesperado, apenas na esperança de que te notem... é meio falta de amor. Amor ao próximo e amor-próprio também, claro que sim!
Para encerrar, aqui vai a prova de que não tenho talento para poesia, segundo um ex-professor meu de Literatura. Crianças, lembrem-se (se a carapuça servir): falem o necessário e escutem o máximo que puderem (nem que seja pra aprender o quanto e o que não se deve falar). Afinal, ter dois ouvidos e apenas uma boca não pode ser à toa, já diz minha avó...

O poema salva muitas
Situações constrangedoras
O difícil é achar rimas
Que se tornem duradouras
Num versinho infantil
Eu te faço um pedido
Seja um pouco mais gentil
Não maltrate o meu ouvido
Já esperei tu falar!
(e não falas coisa pouca)
Pois agora é minha vez:
Égua, porra... Cala a boca!

domingo, 3 de agosto de 2008

da série "detalhes"- O CHATO DA SOLIDÃO


- Não some mesmo em multidões.
- Cama cheia, coração vazio.
- Barulho de trânsito.
- Monólogos.
- Dieta de segunda-feira: nunca mais beber, fumar, praticar exercícios, quem sabe um grande amor e consumo de carboidratos complexos (aquela bobagem de arroz e pão integral...)
- Cinzeiro cheio
- Whisky barato.
- Cantadas baratas.
- Auto-estima de borracha.
- Comida pronta.
- “O diário de Bridget Jones” (1 e 2) ou qualquer comédia romântica, com direito a pipoca, brigadeiro, guaraná e vodka.
- Adriana Calcanhoto e todas as suas músicas.
- Insistência alheia para você “baixar o nível de exigência”
- Teimosia sua de não aceitar conselhos.
- Debochar da própria condição.
- Na pior das hipóteses, aceitar a própria condição.
- Tomar café com Renato Machado
- Dormir com o Jô Soares.
- Não sair de casa sem as palavras de Ana Maria Braga.
- Terreno fértil da carência.
- Escrever em blogs.

Toda solidão é incorrigivelmente chata.

da série "detalhes"- A SOLIDÃO DO CHATO


- A certeza de que a insônia é um mal universal, por isso ,sempre telefonar pra conversar de madrugada.
- Maltratar os outros porque não faz sexo há meses.
- Item anterior quando se é chefe de uma repartição qualquer da vida.
- Silêncio sempre ensurdecedor.
- Adriana Calcanhoto e aquela música terrível do “Buchecha sem Claudinho”
- Sobriedade em barzinhos.
- Autoconfiança de papel.
- Auto-suficiência de araque.
- Mudança de hábitos antigos para manias insuportáveis.
- Dieta eterna: corrida matinal, morrer saudável, nada de apegos, nada de carboidratos ou sensibilidade.
- Debochar do parceiro alheio.
- Debochar do romantismo alheio.
- Debochar da vida social alheia.
- Debochar, enfim.
- Acreditar na máxima “antes só que mal acompanhado” por falta de máximas.
- Gatos de estimação.
- Morar só.
- Comida chinesa/italiana/ tailandesa.
- A certeza de que os amigos sempre estão vivendo em sua função.
- Ter amigos bastante “ocupados”.
- Não ser convidado pra nada com a desculpa de que “acho que você não iria curtir...”.
- Estar solteiro por opção.

Todo chato é um solitário incorrigível.

sábado, 2 de agosto de 2008

Não é da minha conta

Se você fez aquela prova bêbado. Se você não gosta dessa cidade. Se você não é daqui, por isso o sotaque. Não te perguntei onde você comprou aquela camisa que eu adoro ver você usando. Não é da minha conta a se você lê best-sellers. Se você também acha “Revolver” o melhor disco dos Beatles. Se você quis pedir o meu isqueiro emprestado. Se você é poeta. Se você pensou alguma vez em mim. Que estando com ela você é feliz e bem-resolvido.
Não faz parte da minha rotina saber que você é um bom rapaz. Ou um bom amante. Não perguntei nada sobre a sua namorada. Também nem senti a textura da sua barba malfeita. Não é da minha conta o cheiro do seu perfume. O seu local de trabalho, não me interessa. Saber como foi seu dia. Onde você pratica yoga. Se é perto de onde eu pratico. O porquê de você ser vegetariano para confrontar com os meus motivos. Não é para eu saber que você é um outro eu. Que me completa . Que faz parte do meu ser.
Se você compôs uma canção, não importa. Se não foi pra mim, menos ainda. Se você cortou o cabelo, não notei. Se você ficou uma graça e ela adorou, também não percebi. Não te telefonei, A noite com vinho, lua e violão não aconteceu. O dia seguinte foi normal e indolor.
Não é importante pra onde você foca o olhar. Nunca procuro os seus olhos. Se os achei, várias vezes foi pura coincidência.
Seu nome é mais um entre tantas inspirações. Aquele poema foi mais um de tantos para outros. Não é para eu saber se você leu. Não é da minha conta o que você fez na sua vida. Se você foi embora, não é de meu interesse.
E, sobretudo, não é da minha conta o que você sente por mim. O que você fala de mim. O que você pensa sobre mim.
Guarde tudo pra você.

*texto insone e não-irônico.

terça-feira, 29 de julho de 2008

Palavras pra quem vai


Quando a vida chama, é bom atender. Tudo é novo agora, não? Todos te adoram, fazem festa, torcem, cortam bolos, batizam tuas bebidas... Mas acontece só uma coisa: pra mim, nunca haverá uma forma legal de se despedir. A melhor festa de todas nunca suprirá o lugar vazio na mesa jantar. Claro, nada pode ser positivo pra mim, sabes como eu sou! Mas não te preocupes. Não serei egoísta a ponto de te perturbar com saudades de telefones. Nem tu serás agora altruísta para te perturbares com eles. E nem somos dessas coisas, né, fera?
Apenas digo: segue, mano. Provas assim, terás sempre em toda a vida. Mas datas e momentos importantes longe de quem é importante pra ti também podem virar costume. Porém, não te derretas. Mas também, não deixa o coração virar uma rocha.
Conviver com outros mundos é libertador. Desde que se prenda ao objetivo de crescer e ser digno do que conquistou.

Agora, lembra aí:
- Tua saúde é teu tesouro. Só tu agora podes cuidar dela.
- Teu espaço pode ser invadido, sim senhor. Apenas não deixa ele ser violado.
- Lavar a louça não é o fim do mundo.
- Bagunça de fim de semana também não é.
- Gentileza SEMPRE vai gerar gentileza.
- Aceita a condição de que cresceste.
- A saudade vai apertar e sempre pode ficar mais difícil.
- Faz amigos. Mas daqueles de verdade, seu molenga...
- Nunca confunde liberdade com libertinagem. E se quiser praticar, não justifica uma com a outra.
- Ainda podes errar, a idade te permite.
- Perdoa não ter atentado para as despedidas da vida a ponto de não te conhecer o suficiente. Isso dá espaço para mais um item:
-Conhecer as pessoas da maneira mais pura e profunda é a mais incrível das experiências.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Da necessidade da inveja

É muito comum as pessoas reclamarem da inveja alheia. Tudo sempre gira em torno de fazer e sentir inveja. Invejar e ser invejado são condições. Pois bem, já sei em que condição eu me encaixo. Mas primeiro, devo deixar claro que nunca reclamei de inveja de ninguém. Péssimo começo, eu diria. Certa vez, em um grupo de dinâmica, foi perguntado a uma platéia em que eu me encontrava: “Quem aqui já foi vítima da inveja?”. Todos levantaram as mãos sem nem pensar. Repito: todos. Menos eu. Sério. Não lembrava de nenhuma situação em que qualquer pertence ou momento meus fossem objetos de cobiça de alguém (salvo os que eu mesma disponibilizei, diga-se de passagem). “Deve ser a pressão”, pensei. Todos devem passar por uma situação assim: te perguntam alguma coisa e você não sabe ou não lembra da resposta. É o fim quando existe essa pressão de responder logo... Perguntas na frente de platéias, dessas de levantar a mão ou dizer “sim” ou “não” deveriam ser totalmente proibidas. Ainda mais quando a platéia é de um grupo de dinâmica ou terapia! Fazem você se sentir um burro/tapado/lerdo, além de excluído, como me senti em relação à inveja.
Mais tarde me dei conta: ninguém tem inveja de mim. Se tivessem, tentariam me sabotar de alguma forma. Isso eu sei que não acontece, pois eu mesma me saboto. Se me invejassem, me olhariam feio ou torto. Também não ajuda, pois a minha aparência está acostumada a olhares. De pena. Devem estar pensando: “Que sorte a sua!”. Sorte? Gente. Não ser invejado não é bom. É ser tipo uma cor pastel. É passar despercebido ou arrancar comentários como :“Bela parede... que cor é essa, que nem aparece?”. Fato: quando alguém sente inveja de você, é porque algo de melhor você tem. De repente o mundo gira em volta de seu umbigo! Tudo fica mais claro! Aquela área da sua vida que está sofrendo abalos é alvo de inveja, com certeza! E, no auge da prepotência, pode-se esbravejar que “nunca nada dá certo porque tem um fulano que tem inveja de mim e quer ferrar a minha vida!!!!!!!!!”. E tudo isso com o apoio da platéia da dinâmica ou da terapia.
O engraçado foi a minha constatação. Claro, não pensem que eu coloco fé em todos os meus devaneios. Antes de me sentir mal, espero um aviso, uma confirmação concreta. A minha veio através de uma amiga, daí o “concreto”. Estávamos conversando sobre os estilos de vida adotados por nós duas. Para comentar meu comportamento diante de algumas situações, ela soltou: “ É difícil me imaginar no seu lugar. Não invejo sua vida.”
Não lembro bem do gosto que veio na boca naquela hora. Acho que foi de maçaneta. Ou guarda-chuva. Mas foi bem ruim. Humilhante. Como assim? Nem um amigo pra sentir inveja?? Cadê os amigos nessas horas? Ê maravilha...
De qualquer maneira, descobri que a minha condição é de não-invejada para invejosa.
Sinto inveja dos invejados.

domingo, 27 de julho de 2008

da série "detalhes" - MENTIRA DE AMOR


- Não fere.
- Faz bem para a pele.
- Noites incríveis.
- Nunca tem amigos, sai sempre sozinho.
- Ama tudo o que você veste, faz ou diz.
- Te quer feliz, todos os dias.
- “Você tem razão...”
- Adora seu irmão implicante.
- Deixa como herdeiros a raiva, a decepção e uma criança que não é sua.
- Acha você bom de cama.
- Diz que não vive sem você.
- Vive com você.
- Faz você largar os vícios e, quando some, te deixa sem mais nada.
- Lágrimas de crocodilo.
- Motivo pelo qual solitários desistem do amor verdadeiro.
- Aos amores de mentira, prato cheio.
- Os melhores cafés da manhã você toma nessa época.
- Proposta irrecusável para levar um amor adiante.
- Amnésia alcoólica.
- Dor de cabeça conveniente.
- É feia quando vem dos outros.
- É linda quando é pra salvar uma história de amor.
- É trágica quando é descoberta.
- Necessária.
- Dispensável.

Mentira de amor não dói. Mas não sara.

da série "detalhes" - AMOR DE MENTIRA


- Leva dois amores de mentira para passear; um no sábado e outro no domingo.
- Diz que vai sair com “amigos”.
- Dorme com os “amigos” que sai.
- Detesta sua roupa mais bonita.
- No fundo, prefere ser feliz a te fazer se sentir melhor.
- Não gosta da sua família.
- Sua mãe adora e quer que vocês casem.
- Deixa como herdeiros a saudade, os gêmeos ilusão e desilusão e uma criança de pais separados.
- Se perfuma pra sair sem você.
- Diz que não vive sem seu amor.
- Vive sem seu amor (e muito bem).
- Te deixa vícios diversos (inclusive o próprio).
- Lágrimas.
- Um alívio para os solitários.
- Os melhores pijamas do mundo você usa nessa época.
- É beleza que se põe à mesa.
- Promessas de resto da vida.
- Um amigo sempre avisa: “Toma cuidado...”
- Você nunca ama de mentira.
- Você precisa.
- Você viveu ou viverá; foi ou será.

Amor de mentira dói. Mas sara

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Ciclos


Este ano tem tido sabor de descoberta. De ciclos de vida. Não por experiência própria porque a vida alheia é bem mais interessante. Duas pessoas da minha família completam este ano idades significativas: 50 e 90 anos.
Não tenho nenhum dado esotérico preciso (esoterismo é preciso? E nos dois sentidos da pergunta?), mas posso usar por aqui a minha lógica numerologística (?). Bem. Cinqüenta anos é meio século. Muita coisa acontece em um século inteiro. Desde revoluções e guerras (se bem que a 2ª guerra mundial durou menos que uma década) até perspectivas históricas e ideais que mudam. Pois então: meio século é meio caminho andado. Parece que a metade de uma vida (a da Dercy Gonçalves, por exemplo) já foi vivida.
Pode ser “meio” cansativo ter 50 anos. Temos a idéia de que faltam coisas pra fazer. Mesmo quando o já feito já pareça bastante aos olhos dos outros (filhos criados, vida profissional estável, companhia pro resto da vida...). Por outro lado, é cretino pensar que uma vida está vivida aos 50! É preferível esperar por outros 50 anos que, pela estatística de Dercy, nos é de direito!
Então vem a outra idade: os noventa anos. Noventa por cento de um século, hein? Com a saúde envelhecida e os conceitos envelhecidos fica difícil acompanhar tudo e todos. A nossa capacidade de assimilação e absorção do que é novo fica menor. Ficamos lentos. E o mundo não contribui ficando mais rápido.
Imagina chegar aos 90 (anos)! Olhar para trás e ver o quanto foi feito, quantos venceram, morreram, perderam... É um estado um tanto contemplativo e observador. Porém, é uma sala de espera de um encontro fatal. A morte nesse ponto é certa porque se escapou muito dela. É fato: ficamos mais lentos, portanto, menos dispostos a escapar. Mas o mais incrível é o quanto a idade traz a serenidade necessária para aceitar os fatos da vida e da morte.
Percebo isso quando vejo o olhar e a postura de minha avó e meu pai. Meu pai, prestes a completar a 50ª primavera, tem ainda os olhos arregalados para a política e levanta a voz para o que é errado, podre, sujo ou tende para o desastre. Ele ainda possui muito poder de decisão nas vidas de meus irmãos (e minha, por que não?). Ainda arrisca um cigarrinho e uma cerveja aqui e ali. A saúde dá seus trancos, mas pô! Cinqüentinha?! Há muito ainda pra se discutir, tentar consertar... O médico vai ver a cara dele por mais 50 anos ainda... Pode-se terminar o que está incompleto e o corpo vai colaborar, eu sei!
Minha avó já completou 90 anos essa semana e tem os olhos mais cerrados... Apertadinhos, com rugas nos cantos. Não se assusta muito com os erros do mundo, de forma que já os previa, ou algo assim. O que a assusta (e muito!) é a perda gradual de sensibilidade e o desvirtuamento dos valores, onde o erro não é mais um processo de aprendizagem e sim, vício. Mas mesmo assim, mantém a postura calma na cadeira de balanço... Com a sua missão comprida (muitos filhos) e cumprida (todos criados, com poder decisão na vida dos outros...). Não reprova mais levantando a voz. Apenas um balançar delicado da cabeça e os lábios recolhidos para um lado só da boca já revelam a sua reprovação.A saúde é preciosa. O corpo é templo. É esperar. E, segundo ela mesma fala, esperar em Deus.

Dedico este texto à minha avó Lili, ao meu pai de criação e a Dercy Gonçalves. Agradeço a inspiração, o aprendizado e a esperança nas estatísticas.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

da série "detalhes"- O BELO DO RIDÍCULO


- Olhos inchados de manhã.
- Mau-humor três vezes na semana.
- Mudança de cabelereiro.
- Um presente da vó que pode ter ficado meio largo.
- Tropeçar nos pés.
- Item anterior na praça de alimentação de um Shopping sábado á noite.
- Roupas íntimas antigas.
- Nariz vermelho de espirro.
- Gagueira.
- Festa à fantasia (onde o único fantasiado é... adivinha?).
- Air Supply.
- Chaplin.
- Roberto Carlos.
- Cheiro de lavanda.
- Camisola de bolinhas com furo no sovaco.
- Qualquer blusa com furo no sovaco.
- Cofrinho aparecendo.
- Cabelos desgrenhados pelo travesseiro.
- Maquiagem demais, sombrancelhas demais.
- Maquiagem de menos, sombrancelhas de menos.
- Ter duas camisetas favoritas e antigas.
- Ter dois amigos favoritos e antigos.
- Virgindade por exclusão social.
- Promiscuidade por tentativa de inclusão social.
- Solitude de sábado à noite.
- Vazio de domingo.
- Rotina.

Isso é que dá não querer ser RIDÍCULO.

da série "detalhes"- O RIDÍCULO DO BELO

- -Escolher os sapatos de acordo com a cor do botão da camisa, não importando se o pé reclama espremido e implorando sensatez.
- Encolher a barriga todas as vezes que vai sentar achando que ninguém vai perceber.
- Passar três horas em uma cadeira, com alguém que não consegue pentear o próprio cabelo puxando o seu (“ Vai ficar DI-VI-NA”).
- Submeter-se à mesma pessoa para que seu cabelo fique três dias fedendo a amônia de mês em mês.
- Deixar de comer pão pra entrar em uma calça jeans.
- Comprar um vestido dois números menor achando que, deixando de comer pão, entrará nele.
- Abrir o armário e dizer que não tem nenhuma roupa.
- Olhar para o que os outros estão vestindo e achar que dizendo que “os brincos dela não combinam com o cinto” fará com que se sinta menos feio.
- Procurar defeitos.
- Achá-los em si tentando escondê-los.
- Lamentar-se por não se enquadrar nos próprios padrões.
- Não satisfeito, tentar enquadrar os que estão ao seu redor.
- Ser superficial a ponto de não querer saber o que existe por trás do mau-gosto.
- Definir “mau-gosto” como “não sabe se vestir”.
- Achar que Viviane Araújo se apaixonou por seus belos olhos.
- Acreditar que depois da prisão ainda haveria espaço na mídia.
- Não saber que o status de “cantor romântico” é tão ou mais terrível que “pagodeiro”.
- Por fim: não ter nenhum amigo verdadeiro pra avisar que tintura amarelo-miojo no cabelo é o fim.

Isso é que dá querer ser BELO.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Não dá mais tempo (em três atos)


(na frente do espelho)

Porque você, Josimar, acordou atrasado. Meses e meses se preparando (entre churrascos, rodadas de cerveja, futebol e pouco tempo pra mim). Pois é, Josimar. Não dá mais tempo. A moça disse, benzinho, não ouviu? “Depois das oito, ninguém entra.”. Cara teimoso você, hein?
Teima em achar que todos amam te pagar cerveja. Teima em comprar esses livros (com o dinheiro dos pais) que você nunca lê. Teima em levar seus 30 anos com a barriga (acredite, você tem uma. E é enorme). Teima em adiar o que quer fazer da vida. Teima em me cozinhar durante esses 5 anos de namoro. Teima em achar que eu não tenho mais o que fazer a não ser te esperar. Teima em dizer que ainda dá tempo.
Não dá não, Josimar. Não dá.
Chance assim, não vai mais ter. Ainda mais com o Orçamento. Não sei te explicar direito o que o Orçamento tem a ver (eu fiz Economia Doméstica, não sou obrigada a saber. E você, que fez Administração?). Mas ele ta aí, mandando e desmandando oportunidades como essa, que você acaba de perder.
Você não pensa na aposentadoria, Josimar? Quem vai te sustentar? Tua mãe, com cheques psicografados do Além? Eu? Nem morta! (e falo sério). Aliás, Josimar, você não pensa em nada? Tens relógio aí? O tempo passa! E dele não tem mais pra você.
Aah, claro... ora veja... Você acordou. Mas foi tarde demais. Passou da hora. Portões fechados, lembra do que a moça falou? Nunca mais você vai ter chance assim, ouviu?
NUNCA!
Por isso eu cansei de te esperar. Ei, Josimar, cansei de você. É inútil querer crescer do teu lado. Larguei de mão. Amanhã mesmo vou dar um pé na tua bunda e te mandar passear e crescer, seu cretino! Você acha que eu, uma mulher independente, bem criada e bem-sucedida vou querer casar contigo??????? Se você tivesse ao menos pedido a minha mão... Pra eu ter o prazer de falar um “NÃO” bem sonoro na tua cara, animal!

XXX
(encontrando com Josimar)

- Escuta, eu tenho que falar com você uma coisa muito séria...
- ...poxa, linda... Senti tua falta depois daquela vacilada que eu dei ontem... Tsc... me atrasar no dia da prova do concurso, né? Que animal que eu sou... Ainda bem que você tá aqui... Não seria o mesmo sem você. O que você ia falar mesmo?
-... Er... é que abriu um edital novo pra outro concurso...........................................

XXX
(novamente na frente do espelho)

Pensando bem, não dá mais tempo. Vai que você resolve me pedir em casamento... Passei dos 30. Melhor não arriscar.


sexta-feira, 11 de julho de 2008

Eu, a Ellen, seus olhos grandes e azuis e a P... da entrevistada.


Saí um pouco do quarto pra fazer coisas de gente normal. Dar uma volta pela sala, ver qual é a do pátio, passar pra fazer aquela visitinha na cozinha e conferir as novas da família. Nesse espaço de tempo, sentei no sofá pra encontrar o motivo que fez meu pai assinar os pacotes de canais daqui de casa. Mentirinha... É que eu sei o horário do programa da Ellen DeGeneres.
Ellen DeGeneres é uma atriz que ficou mais famosa por assumir publicamente sua homossexualidade do que por ter feito um ou outro trabalho na TV americana. Perdoem a ignorância do meu mundinho verde, meus queridos, mas não lembro de nenhum trabalho relevante dessa moça na minha vida. Até hoje. Fato: ela apresenta um programa de TV e eu assisto. Até hoje.
De primeira, posso dar as impressões: Ellen é metida a engraçadinha, faz umas dancinhas feias no meio da platéia comprada e solta aquelas piadinhas sem graça que brasileiros não entendem. É...
E hoje, ela quase me fez quebrar a televisão. Não sei se puderam notar meu proposital aborrecimento sarcástico com esse programa e sua respectiva apresentadora. É mais uma explicação besta, confesso... mas vai lá.
Aquela loira filha duma égua levou uma louca que promove encontros com milionários em uma espécie de reality-show para ser entrevistada naquela droga de programa!( E a raiva me faz escrever períodos longos sim!)
Tudo bem, estamos acostumados com entrevistados do Jô e suas profissões esquisitas... Não me irritou o convite em si, mas o que aquela P.. .de entrevistada falou.
O que eu me lembro: entra a convidada, senta na poltrona ao lado de Ellen e a edição mostra um VT, com a cidadã dando uma bronca em possíveis candidatas a futuras viúvas de milionários setentões. Segue o resumo do que ela latia.
P... da entrevistada: “Primeiro, eu não gosto de cachos. Vocês que têm cabelo cacheado, alisem já! Homens gostam de passar as mãos em cabelos sedosos e macios, não nessas palhas e ninhos de morcego que vocês me apresentam. E tem mais: mulheres de cabelo curto, coloquem extensões.”
Levantei do sofá irada. Ela tocou no meu ponto fraco! Meu cabelo é cacheado e agora tá curto! Não, não... esqueçam das discussões sobre os “padrões impostos pela sociedade”, sobre a declaração nojenta dessa P...de entrevistada... Temos pessoas mais bem capacitadas pra escrever sobre isso. Não tive aquela atitude de sair levantando bandeiras a favor do cabelo crespo e dos cortes curtos (“não à chapinha!”, “tesouras comandam!”). Não queria. Não conseguia. Naquele momento, me deixei levar pelo direito de me sentir totalmente excluída. Deixei as bandeiras de lado e mastiguei toda aquela revolta entre duas fatias de pão. (Minhas revoltas são assim. Pacífico-gastronômicas. E totalmente individualistas.).
Agora que me dei conta de que em nenhum momento passou pela minha cabeça que o cabelo é o ponto fraco de qualquer mulher. E que, com certeza, muitas que têm o cabelo cacheado e/ou curto se sentiriam (ou já se sentem) ofendidas com o comentário da P... de entrevistada. Mas foi um momento muito meu, na verdade: eu, a Ellen, seus olhos grandes e azuis e aquela P... de entrevistada...
E mais! Imaginem que depois fiquei pensando sobre o fato de ter me incomodado com a declaração da P... de entrevistada. É um golpe duro saber que você se importa com a opinião alheia. Eu? Ficar triste por me dar conta de que posso não agradar um velho babão milionário? Que decadência...
Mas... Por que tanta hostilidade com a simpática loirinha engraçadinha? O que a Ellen tem a ver com a minha auto-estima, caramba?
Ué. Nada. Ela é rica, loira, arranjou uma linda noiva e não precisa agradar velhos ricos. Ah, deixem eu ficar mal-resolvida um pouquinho e descontar minha raiva nela, vai...

Em tempo: Eu gostaria muito de colocar imagens aqui nestes textos... Mas ando apanhando da internet... Não consegui colocar nem foto no meu perfil ¬¬... Mil desculpas pela crueza...

quinta-feira, 10 de julho de 2008

"Sobre estar só..."


Eu tenho propriedade para falar sobre solidão. O que vocês esperariam de alguém que vive dentro dum quarto?
A princípio, devo dizer que ficar só não é ruim. Toda essa novela que fazem sobre a tragédia da solidão é balela. Uma desculpa muito da sua esfarrapada para vender revistas de temática adolescente ( com dicas de como “causar” na “balada”, arrumar um “gatinho” ou como medir a temperatura do namoro) e as próprias novelas (nos finais, nem o vilão fica sozinho, pois ele sempre morre...).
Cheguei à conclusão de que o que torna os solitários marginalizados são os não-solitários. A culpa é sim do casalzinho de namorados da pracinha tomando sorvetinho e falando um com o outro no diminutivo. A culpa é do casal de velhinhos de “Último romance”. É do Rodrigo Amarante que não tinha nada pra fazer e compôs essa música. A culpa é dos compositores e poetas que compõem sobre a solidão! Sempre fazem dela um suplício! E eles sabem lá o que é ser só?
Pois eu sei. E é uma maravilha, tá? Não divido banheiro com ninguém, por exemplo. Fico imaginando a cena com alguém abrindo a porta do nada. Nada contra, só acho que é uma questão de química. Os cientistas dizem que o cheiro conta muito nos relacionamentos... Pois é. Posso fazer minhas necessidades tranqüila, sem ninguém pra me incomodar. Nem pra dizer que eu sou bonita, ou que eu fico melhor sem maquiagem, ou que eu pareço um anjinho dormindo...
Vou ao cinema só. E é bom, ninguém me atrapalha. Não fazem comentários no fim (comentários do fim não servem pra nada, pois nunca mudam os fatos da história. Não sei pra que isso), não pedem minha pipoca nem meu refrigerante. O negócio pega é quando o filme é chato. Já tentei engatar uma conversa no meio de um filme chato (“Consegue ver as horas?”)... Nunca façam isso. Levem alguém com vocês. A namorada dele pode não gostar...
Eu cozinho pra mim mesma! Olha só, que mágico. Meu macarrão é muito bom. Elogio sempre. Engordo sozinha também.
Meus sentimentos, eu não divido. As alegrias das boas notas da faculdade, dos elogios ou da felicidade expressa (aquela que dura um dia) são só minhas. Deixa comigo, eu saboreio só. As tristezas é que são meios indigestas... É preciso um estômago de avestruz de vez em quando. Ou alguém pra compartilhar.
Tenho muitos momentos para refletir. É bom ter um tempo para si. Você observa onde está errando nos seus relacionamentos. E como eu não tenho nenhum, sobra mais tempo pra eu ficar me perguntando por que eu sou tão solitária.
Ó. Aí veio de novo. A mania de se rebaixar porque é sozinha... Nada a ver isso. É muito legal ficar só. Viram que vantagens?
Tá, eu percebi sim. As desvantagens têm um tamanho descomunal. Eu sei disso. Mas vejam só o lado bom. Para desfrutar das vantagens integralmente, é até preferível saber de cor as desvantagens! Desbravá-las sem medo. No fim, você se torna merecedor de todas as vantagens, sendo que já passou por todas as duras e catastróficas desvantagens. Ei! Peralá! Isso é uma vantagem! He, he... Tentador, não? O que vocês acham de entrar pro clube, hã? Maravilha, hein? Todo mundo sozinho, curtindo... O que vocês acham? Não estou ouvindo... Cadê vocês? Hein? Podem falar mais alto, tá?
Alguém?
...

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Um nome


Resolvi escrever para contar como foi que eu cheguei ao nome do blog. Sabe, eu acho meio pateta explicar algumas coisas. Coisas tipo nomes. Se foi esse o nome que eu escolhi, é esse e pronto, não? Mas preciso confessar a vocês que sofri um vazio criativo depois de assistir “CQC”, aquele programa do Marcelo Tas que passa na Bandeirante...
Gente, depois da enxurrada de criatividade, pensamento rápido e habilidade com as palavras que eu vi ali, me desculpem... Bateu aquela burrice... Não escrevia mais nada sem odiar e jogar fora.
Deixando o complexo de mediocridade de lado (por um momento apenas, não se acostumem), vamos aos nomes. O primeiro deles foi “Alma de borracha”. No caso, seria a referência de uma referência; este é o nome de um disco de 87 (se não me engano) do Beto Guedes, cantor mineiro adorado por mim. “Alma de borracha” também é a tradução de “Rubber soul”, álbum dos Beatles. Beto, assim como eu, é beatlemaníaco. “Rubber soul” é o meu xodó dos Fab4. Simplesmente VENERO este álbum.
Dessa forma, “Alma de borracha” só seria uma identificação de coisas que eu gosto, não sendo tããão óbvio. Claro, significados mil poderiam ser atribuídos ao nome, mas não é intenção minha. Tudo foi por água abaixo quando descobri que já havia um blog com esse nome. Ok, a busca continuou, passando por flores (“Margarida psicodélica”, e não me perguntem o motivo...); frutas (“Pé de melancia” [?]); sabores (“Azedume magnético”), infância (“Bodoque atômico”)... e tudo isso sem sucesso de englobar a proposta do blog (que cá entre nós, nem eu mesma sei).
Resolvi apelar para o maior clichê de todos: o NADA. É, crianças. Cheguei à pérola “Extremo do nhé”. Para quem não sabe, “nhé” é um barulho de velho. Velhos fazem barulho, a saber. Juntamente com “hein?!”, “ãhn”, “humpf”, “quem?” e “nhan”, o “nhé” representa o enfadonho, o ápice da chatice e da reclamação. Fiquei com essa idéia na cabeça até, mais tarde, achar uma comunidade do nosso querido ORKUT que conseguia definir o dito “Extremo do nhé”. E para isso, arranjou a interjeição mais bizarra ainda: “Bleh”. Assim. Com maiúscula e sem nenhum ponto de exclamação no fim...
Aí não deu. Putz, eu pensei, assim já é demais. É ser rabugenta ao extremo! E é preciso uma fachada mais simpática para conseguir leitores, hein?!
Depois da triste constatação de que eu sou mesmo muito monótona (assim, em pessoa), resolvi ir para o meu quarto e escrever. Só que não saía nada! Olhando para as paredes, o lençol e meus sapos de pelúcia (adivinhem: todos na cor verde...), pensei que esse negócio de blog não ia dar certo, já que eu não tinha nem um nome decente e muito menos o que escrever no primeiro post.
Estou finalizando o post e, que engraçado, consegui o nome e o assunto do primeiro texto!
Acho que vou passar mais tempo do que eu imagino dentro deste quarto...