terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Nora (ou “Try a little tenderness”)

“Oh she may be weary
Those young girls they do get weary
Wearing that same old shaggy dress
But when she gets weary
You try a little tenderness”

Eu a achava muito sexy. Aquele sarcasmo, aquele olhar irônico. Aquela maldade. No início, fiquei maluco. Corria atrás, telefonava, queria passar a noite inteira com ela (a chave de pernas...). Depois, ela se tornou a indisposição em pessoa.
Era muito inflexível. Era radical. A flor de lótus tatuada no ombro esquerdo (linda!), apesar de flor, era agressiva. Na verdade, Nora era um ultraje. Desprezar quem não lhe agradava à primeira vista era uma de suas marcas. Me fazia cada vergonha... Adorava ficar séria diante dos meus amigos piadistas. O pessoal rindo das piadas e ela lá... Impávida. Achava prazeroso analisar e não ver nada de especial em “Ternurinhas” (assim chamava as pessoas de bem, bacanas e alto-astrais). Mentia. Omitia. Mas, no fundo, eu sei que não se orgulhava. Uma vez, quando eu perguntei por que tanta amargura, disse pra mim que gostava de pensar que a ternura poderia um dia vir em latas decoradas, que nem pannetone, que você compra, se delicia e depois guarda outra coisa na lata. Ou só guarda mesmo pra lembrar-se do sabor e do cheiro. “Falta ternura no mercado”. E ela achava que um dia ia chegar. Assim. Que nem magia.
Por exemplo, quando ouviu Larissa dizer que amava o ex, seu estômago revirou. Achou nojento. “Coitada. O que é a paixão... O que é a carência...É o que dá se envolver.” Na minha frente. Eu apaixonado. Era o que ela realmente gostaria de falar pra Larissa, mas não podia. “Claro que não. Com amigos a gente mede palavra. Não é assim, na bucha: ‘Se toca’”. Acreditem: ela era muito capaz de dizer isso... Já disse pra mim.
E enquanto Larissa contava sua dor de amar, Nora ouvia com cara de asco. E depois de ouvir tanta benevolência, tanta falta de mágoa, tanta amabilidade, a repulsa se transformou (susto!) em empatia, mais tarde, depois que a gente viu aquele filme cabeça. “ Como é bonito ver um alguém que não consegue odiar...O mundo tem jeito. E, graças a Deus, não sou eu quem vai promover essa mudança. Tem gente melhor pra isso”. Ah, vou confessar, achei bonitinho quando ela falou assim. Ela tentou... Mas ficou esquisito: o ar de arrogância junto com o comportamento autodestrutivo. Era demais pra mim. Desisti de entender.
Talvez Nora tenha esperanças de ser amada um dia. De dizer pieguices, ouvir Carpenters, ficar horas pendurada no telefone com voz de criança, ser traída, correr atrás do amor perdido e chorar de verdade. Por amor. Sem pensar. Quem sabe ser uma Ternurinha. Eu não consegui.
Talvez ela esteja um pouco entediada.
Nora merece tão mais...
Um pouco de delicadeza, quem sabe..



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